16 de dez. de 2008

PrasBandas inverte o lado da música independente em Curitiba


Projeto pioneiro valoriza bandas independentes nos bairros de Curitiba e dá oportunidade aos que não tem condições de participar da “cena cultural curitibana"



Idealizado pelo produtor musical Getulio Guerra, o Projeto “PrasBandas” surgiu em novembro de 2005, para apresentar bandas independentes nos bairros curitibanos. Na luta pela descentralização da cena musical, sem patrocínio, o idealizador já organizou 4 edições do Projeto: no Sitio Cercado, Boqueirão, Xaxim e Hauer. Algumas das bandas participantes conseguiram destaque na cena cultural curitibana.

Com a vontade de mobilizar a música independente e inverter o movimento cultural, dando oportunidade aos que não tem condições de se deslocar até o centro para participar da vida musical independente de Curitiba, Getulio Guerra realizou a primeira edição no Sitio Cercado. Sem muitos recursos, distribuiu panfletos e cartazes no bairro, com a chamada para interessados em apresentar sua banda em um show. Algumas regras para poder se inscrever: música própria, em português e pelo menos um integrante ser do bairro da vez. Os locais para os shows foram todos conseguidos junto aos moradores.

O bibliotecário Mauricio Santana, 34, inscreveu sua banda de rock alternativo “5 graus”, ao ver o cartaz em uma distribuidora de bebidas no bairro. “Eu me inscrevi e mobilizei família e amigos. Foi muito legal, depois, ser reconhecido pelos moradores”. Getulio destaca a importância da idéia de pertencimento quando se tem vida cultural no local onde se mora. “Cada bairro é um pequeno país e ter a vida cultural perto é uma grande conquista pra muita gente que não tem dinheiro, por exemplo, para se divertir ou tocar no centro da Cidade”, afirma.

Atualmente a banda do Mauricio que tocou pela primeira vez no evento organizado pelo “Pras Bandas”, tem CD e se apresenta no VOX, Jokers, Hangar, 92º e Korova, que são bares no centro da Cidade. Já Ricardo Salmazo, do Combinado da Silva Só (grupo musical de samba de raiz) diz ter voltado do centro para o seu bairro. “Fizemos o nosso caminho difícil primeiro. Conseguir espaço em bares centrais para então voltar ao bairro com o projeto do Getulio. Tocamos no Boqueirão, onde moro, e isso foi muito renovador”, disse.


Novos Projetos

O PrasBandas, em 2008, foi para dentro da Rádio Comunitária do Sitio Cercado. Bandas independentes eram selecionadas para em uma hora de programa apresentar suas produções. Depois, por motivos de incompatibilidade com a rádio, a equipe começou a realizar o programa em casa. Filmam as bandas tocando e o resultado final vai para internet, mais precisamente para o youtube. (www.youtube.com/prasbandas)


O Projeto nos bairros que ficou em “stand by” por um tempo, volta com tudo em 2009, como um dos selecionados pelo Fundo Municipal de Cultura, através do edital para festivais de música independente. Portanto, no PrasBandas 5, serão realizadas quatro mostras em praças públicas de bairros da periferia e também quatro oficinas gratuitas de cinema, fotografia, bateria e astrologia para a comunidade. A primeira edição dessa nova etapa acontece de fevereiro a abril, no bairro Uberaba. As oficinas na Escola Municipal Maria Marli Piovesan e a mostra na Praça Renato Russo. Getulio Guerra avisa que "as crianças que aprenderem nessas oficinas por esses 2 meses, se apresentarão junto com as bandas inscritas do bairro e ficarão famosinhas."


Resumo PrasBandas (com informações do jornalista Teo Arruda)

A mostra se caracteriza por proporcionar a oportunidade para bandas iniciantes dos bairros apresentarem músicas autorais, em português, com uma boa estrutura de som e em seu próprio bairro. Cada inscrita apresenta duas músicas próprias e tem a oportunidade de tocar no mesmo palco com bandas convidadas de destaque da cena curitibana. Cobrando ingressos populares de R$3,00, o Pras Bandas pedia entrada de livros usados. Reuniu cerca de 700 exemplares que já foram doados para escolas públicas nos bairros em que as edições foram realizadas. Agora em 2009, será sempre gratuito, em praças públicas.

Entrevista com Getulio Guerra - Crédito da foto: Andressa Farion

Foto topo da matéria: Banda Gruvox, do PrasBandas 4 - no Hauer.

Crédito da Foto: Douglas Fróis

Responsável pela matéria: Ana Carolina Caldas












15 de dez. de 2008

OS INDIFERENTES, DE ANTONIO GRAMSCI.

Odeio os indiferentes. Como Friederich Hebbel acredito que "viver significa tomar partido". Não podem existir os apenas homens, estranhos à cidade. Quem verdadeiramente vive não pode deixar de ser cidadão, e partidário. Indiferença é abulia, parasitismo, covardia, não é vida. Por isso odeio os indiferentes.

A indiferença é o peso morto da história. É a bala de chumbo para o inovador, é a matéria inerte em que se afogam freqüentemente os entusiasmos mais esplendorosos, é o fosso que circunda a velha cidade e a defende melhor do que as mais sólidas muralhas, melhor do que o peito dos seus guerreiros, porque engole nos seus sorvedouros de lama os assaltantes, os dizima e desencoraja e às vezes, os leva a desistir de gesta heróica.

A indiferença atua poderosamente na história. Atua passivamente, mas atua. É a fatalidade; e aquilo com que não se pode contar; é aquilo que confunde os programas, que destrói os planos mesmo os mais bem construídos; é a matéria bruta que se revolta contra a inteligência e a sufoca. O que acontece, o mal que se abate sobre todos, o possível bem que um ato heróico (de valor universal) pode gerar, não se fica a dever tanto à iniciativa dos poucos que atuam quanto à indiferença, ao absentismo dos outros que são muitos. O que acontece, não acontece tanto porque alguns querem que aconteça quanto porque a massa dos homens abdica da sua vontade, deixa fazer, deixa enrolar os nós que, depois, só a espada pode desfazer, deixa promulgar leis que depois só a revolta fará anular, deixa subir ao poder homens que, depois, só uma sublevação poderá derrubar. A fatalidade, que parece dominar a história, não é mais do que a aparência ilusória desta indiferença, deste absentismo. Há fatos que amadurecem na sombra, porque poucas mãos, sem qualquer controle a vigiá-las, tecem a teia da vida coletiva, e a massa não sabe, porque não se preocupa com isso. Os destinos de uma época são manipulados de acordo com visões limitadas e com fins imediatos, de acordo com ambições e paixões pessoais de pequenos grupos ativos, e a massa dos homens não se preocupa com isso.


Mas os fatos que amadureceram vêm à superfície; o tecido feito na sombra chega ao seu fim, e então parece ser a fatalidade a arrastar tudo e todos, parece que a história não é mais do que um gigantesco fenômeno natural, uma erupção, um terremoto, de que são todos vítimas, o que quis e o que não quis, quem sabia e quem não sabia, quem se mostrou ativo e quem foi indiferente. Estes então zangam-se, queriam eximir-se às conseqüências, quereriam que se visse que não deram o seu aval, que não são responsáveis. Alguns choramingam piedosamente, outros blasfemam obscenamente, mas nenhum ou poucos põem esta questão: se eu tivesse também cumprido o meu dever, se tivesse procurado fazer valer a minha vontade, o meu parecer, teria sucedido o que sucedeu? Mas nenhum ou poucos atribuem à sua indiferença, ao seu cepticismo, ao fato de não ter dado o seu braço e a sua atividade àqueles grupos de cidadãos que, precisamente para evitarem esse mal combatiam (com o propósito) de procurar o tal bem (que) pretendiam.

A maior parte deles, porém, perante fatos consumados prefere falar de insucessos ideais, de programas definitivamente desmoronados e de outras brincadeiras semelhantes. Recomeçam assim a falta de qualquer responsabilidade. E não por não verem claramente as coisas, e, por vezes, não serem capazes de perspectivar excelentes soluções para os problemas mais urgentes, ou para aqueles que, embora requerendo uma ampla preparação e tempo, são todavia igualmente urgentes. Mas essas soluções são belissimamente infecundas; mas esse contributo para a vida coletiva não é animado por qualquer luz moral; é produto da curiosidade intelectual, não do pungente sentido de uma responsabilidade histórica que quer que todos sejam ativos na vida, que não admite agnosticismos e indiferenças de nenhum gênero.


Odeio os indiferentes também, porque me provocam tédio as suas lamúrias de eternos inocentes. Peço contas a todos eles pela maneira como cumpriram a tarefa que a vida lhes impôs e impõe quotidianamente, do que fizeram e sobretudo do que não fizeram. E sinto que posso ser inexorável, que não devo desperdiçar a minha compaixão, que não posso repartir com eles as minhas lágrimas. Sou militante, estou vivo, sinto nas consciências viris dos que estão comigo pulsar a atividade da cidade futura que estamos a construir. Nessa cidade, a cadeia social não pesará sobre um número reduzido, qualquer coisa que aconteça nela não será devido ao acaso, à fatalidade, mas sim à inteligência dos cidadãos. Ninguém estará à janela a olhar enquanto um pequeno grupo se sacrifica, se imola no sacrifício. E não haverá quem esteja à janela emboscado, e que pretenda usufruir do pouco bem que a atividade de um pequeno grupo tenta realizar e afogue a sua desilusão vituperando o sacrificado, porque não conseguiu o seu intento.


Vivo, sou militante. Por isso odeio quem não toma partido, odeio os indiferentes.

Antônio Gramsci



OS INDIFERENTES, DE ANTONIO GRAMSCI - 11 DE FEVEREIRO DE 1917
do livro La Città Futura