Vim viver em Curitiba no início de 1969. Anos duros de ditadura, mas eu não sabia. Não sabia o que era uma ditadura. Vim do sítio direto para a capital, e aqui eu era o verdadeiro capiau. Tudo novidade e tudo obscuro. Tudo curiosidade e medo. Tudo esperança e preocupação: e se não der certo? Vim morar na Rua Riachuelo. Era o único local possível de se morar com pouco dinheiro. A noite na Riachuelo, para um capiau como eu, era tomada de assombro, curiosidade e o cheiro de sexo das prostitutas que por lá vagavam. Também andavam por lá alguns gays.
Fui morar numa pensão onde, algum tempo depois, conheci um gay. Um bancário que trabalhava no Bradesco. Na mesma pensão, morava também um estudante vindo do interior que só saía com gays. Era um homossexual e negava. Era tudo enrustido, tudo oprimido. Era a ditadura.
Ambos, capiaus e homossexuais, éramos rejeitados pela sociedade curitibana. Excluídos, construíamos nossos próprios habitats, mundos, vidas. Os capiaus, com muito estudo e esforço, iam individualmente e aos poucos se inserindo na sociedade. Através do trabalho e de casamentos, conquistaram seus espaços sociais.
A comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT) continua na árdua batalha da afirmação: sou gênero humano, mereço respeito e tenho direitos.
De início, alguns poucos se autoidentificam como homossexuais. Hoje, já organizados em várias ONGs, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais lutam por dignidade. E um importante ato político é a Parada da Diversidade, que une milhares de pessoas em vários cantos do mundo.
A importância política de atos como esse é demonstrada pelo próprio tema que abordam. O tema da edição deste ano da Parada da Diversidade em Curitiba (”Seus direitos, nossos direitos, direitos humanos”) deixa claro pelo que clamam.
Clamam pelo direito de inclusão e de identidade social e pelo fim do preconceito. São homens e mulheres que têm direito à identidade e não ao tratamento pejorativo de “viado” ou “sapatão”, como usualmente são chamados e chamadas.
As paradas da diversidade servem para pôr a cara pra fora, dar o grito de identidade e mostrar à sociedade que, na rua, caminha mais um filho seu que quer paz, liberdade e justiça. Por isso, também pedem “o fim da violência e da impunidade”.
Assim como os capiaus, as pessoas LGBT conquistarão seus direitos, se libertarão da ditadura da sociedade e construirão a sua identidade e visibilidade.
Sair da opressão da noite, para o sol da igualdade. Por isso lutamos.
Dr. Rosinha, médico pediatra, é deputado federal e coordenador da Frente Parlamentar LGBT na região Sul do país.
http://www.drrosinha.com.br/
[*] Artigo publicado no jornal da Parada da Diversidade de Curitiba, que acontece no próximo dia 27 de setembro de 2009.
Foto: Joka Madruga